sábado, 18 de fevereiro de 2012

Selvagem amor

Não conheço seu nome ou paradeiro
Adivinho seu rastro e cheiro
Vou armado de dentes e coragem
Vou morder sua carne selvagem
Varo a noite sem cochilar, aflito
Amanheço imitando o seu grito
Me aproximo rondando a sua toca
E ao me ver você me provoca
Você canta a sua agonia louca
Água me borbulha na boca
Minha presa rugindo sua raça
Pernas se debatendo e o seu fervor
Eu me espicho no espaço feito um gato
Pra pegar você, bicho do mato
Saciar a sua avidez mestiça
Que ao me ver se encolhe e me atiça
E num mesmo impulso me expulsa e abraça
Nossas peles grudando de suor
De tocaia fico a espreitar a fera
Logo dou-lhe o bote certeiro
Já conheço seu dorso de gazela
Cavalo brabo montado em pelo
Dominante, não se desembaraça
Ofegante, é dona do seu senhor
Hoje é o dia da graça,
hoje é o dia da caça e do caçador
(Caçada - Chico Buarque)
"O polvo tem os olhos do pescador que o atravessa. É de terra o homem que será comido pela terra que lhe dá de comer. O filho come a mãe e a terra come o céu cada vez que recebe a chuva de seus peitos. A flor se fecha, glutona, sobre o bico do pássaro faminto de seus méis. Não há esperado que não seja esperador nem amante que nao seja boca e bocado, devorador devorado: os amantes se comem entre si de ponta a ponta, todos todinhos, todo-poderosos, todo-possuídos, sem que fique sobrando a ponta de uma orelha ou um dedo do pé." - Eduardo Galeano

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